sexta-feira, 27 de julho de 2012

FIM DE NOITE

A noitada foi boa na terra da garoa. Carlos Barbosa, bastante envergado como fora um arco preso por uma corda flexível, forte e inexistente entre a cabeça e os pés, derrama humildades tentando se livrar de fazer poemas, porque Leandro Henrique, gesticulando e gingando feito um capoeirista em câmera lenta, jorra a sua verve tentando convencer o amigo a assim descrever sua biografia, enquanto André Aguirra, pitando um cachimbo imaginário, planta as nadadeiras - quero dizer -, os pés no chão e assim fica fincado tal um poste robótico somente virando lenta, lenta, lentamente a parte superior do corpo que gira em fuso horário desconhecido para participar da conversa, mas sempre escondendo o ouro que será transformado em arte nos Poemas Brabos. Fábio Roberto, do alto da sua experiência barística, encontra apoio para mente e corpo se divertirem e descansarem ao mesmo tempo, encostado em um orelhão e na mesinha estrategicamente ali postada pela divina providência, fruto de anos doando pequenos goles ao Santo, para comentar e apimentar os acalorados debates que só se resfriam com a décima primeira saidera, ou mais. O assunto Jairo esgotou-se, assim como os clientes do Batista que já lavou do bar o chão, as paredes, o balcão, a cozinha toda com suas panelas, o teto e a alma. O papo nasce e renasce espontaneamente, células multiplicando-se ora fractalmente, ora parecendo desordenadas, mas é impressionante como há organização nesse caos. A porta do Bar se fecha, mas nunca as esperanças de mais uns goles que chegam através das latinhas de cerva gentilmente ofertadas pelo último garçom que apressado se despede sem cerimônia. E os quatro/quintos percebem que é o fim da noitada. É hora das últimas combinações que irão esquecer no dobrar da primeira esquina. Não vão embora sem antes devolverem ao planeta um pouco do que foi a noite, então urinam no meio fio. E seguem as urinas límpidas e douradas de cerveja carregando os papos, sonhos, revoluções, poemas e canções rumo ao dia que nascerá. Um uivo se escuta lá nos montes. Não há garoa.

faroberto

Um comentário:

disse...

Representação perfeita. A descrição das personagens está minuciosa, mais legítima até do que a realidade.