quinta-feira, 27 de setembro de 2012


Crônica da solidão

A mulher encostada na janela olhava para o céu enegrecido pela noite, analisando as baforadas que deixavam a imagem turva pela fumaça expelida. Um mosquito pousou atrevidamente em sua mão. Observou o inseto e deixou que a picasse, queria algum tipo de contato, com algum ser.

Naquela solidão que se encontrava a coceira provocada pelo bicho já era um sinal de sensação, precisava das sensações para sentir-se viva. Coçou novamente o dorso da mão. Soltou mais alguns tragos e decidiu beber mais um gole do vinho ácido e ruim.

Pela madrugada que seguia tentou abafar todos os pensamentos que lhe vinham na cabeça. Queria poder dormir sem sonhar, sem produzir sequer pensamento algum. Apenas dormitar. Pegou o livro e leu mais um capítulo lentamente para ganhar umas horas daquele dia que custava a acabar.

Deitou o livro na cabeceira e trocou-os pelas palavras cruzadas. Efeito danoso; estrago com sete letras. Pensou, elucubrou, tinha tempo, veio-lhe injúria. Conferiu. Acertou. Guardou para o outro dia o término do restante. A madrugada era lancinante e aterrorizadora.

O sono chegou-lhe ás cinco. Os sonhos chegaram ás seis. Neles estavam tudo de mais agonizantes e pungentes, eram unha e carne com a realidade, nada tinham de oníricos. Acordou e resolveu passar uma pomada na coceira, era melhor assim.

 Marili Santos

Nenhum comentário: