quinta-feira, 7 de março de 2013

A Fábula dos Toilletes


 Seja chamado de  toillete, wc, banheiro, bathroom, latrinas ou simplesmente banheiro, trata-se do lugar mais democrático do mundo.
Gordas, modelos, feias, periguetes ou anãs; galãs, esqueléticos, bombados, obesos ou baixinhos; bom ou ruim, no banheiro todos se igualam, desnudam corpo e alma, despojam-se de vergonhas, orgulhos e roupas. Fitam o espelho fazendo caretas ao escovarem os dentes. Tiram as dentaduras, penteiam as madeixas, passam cremes e batons, fazem exercícios, se barbeiam. Massageiam seios, pernas, costas e egos, masturbam seus sonhos eróticos, fazem necessidades ou até coisas sem necessidade alguma. Leem, estudam, respondem emails, trabalham no lap top. E banham-se após um carinhoso ensaboar das partes íntimas ou comuns, públicas ou privadas.

Pois foi ali que tudo aconteceu: a rebeldia de uma privada pública.

Certo dia em um determinado banheiro de rodoviária daqueles com sachezinhos, sabonetinhos, toalhinhas, balinhas, remedinhos e no qual se paga alguns reais para utilizar, uma antiga privada, após assistir a propaganda eleitoral e cansada após anus e anus de lida ininterrupta enviando dejetos para a profundeza dos esgotos, revoltou-se por não ter perspectiva de uma justa aposentadoria, um descanso merecido pela valorosa labuta diária, enquanto os grandes responsáveis pelo seu excessivo trabalho locupletavam-se em seus cargos mentindo na TV.

Sonhava um mundo melhor, justo, eternamente limpo, perfumado com aroma de notas florais e verdes, fragrâncias de ar fresco, delicado e marcante.
Mas eis que o apertar do botão da descarga a despertou para a dura e mal-cheirosa realidade. As nádegas de um político em campanha nela sentaram, soltando um fétido pum. A frustração, raiva e revolta a-cu-muladas fez a privada reagir. Não exatamente pelo pum, mas sim porque político só faz merda e ganha mais do que qualquer um, pensou ela.

Foi instintivo. Reunindo todas as suas forças sugou o político bundão com tanta violência que o fez o dobrar-se ao meio, engolindo o incauto para o seu buraco negro.

Satisfeita pelo ato, deu um arroto que veio pelos canos formando borbulhas em sua água. Imediatamente pôs-se a bater o assento na estrutura de louça, divulgando a façanha que se espalhou como um viral de cabine a cabine daquele sanitário, depois para os banheiros dos prédios vizinhos e assim sucessivamente, contagiando todas as privadas da cidade, que absorveram cada político desavisado que tentou se livrar dos próprios detritos.

E eles foram tragados para depois aparecerem boiando nos rios, sendo salvos com nojo pelos bombeiros. Nenhum banheiro escapou: prédios comerciais, shoppings, restaurantes, residências, templos, assembleias, câmaras. Foi ridículo ver vereadores urinando em postes, muros, árvores e deputadas defecando em vasos, baldes, matinhos. Alguns mais pudicos, como o então prefeito Kassub, entrelaçavam as pernas para segurar ao máximo as vontades, mas não houve jeito. Cedo ou tarde fizeram nas calças ou calcinhas.

Compraram fraldas, apelaram para lenços umedecidos, ressuscitaram bidês e penicos, tudo se esgotou. Em vão, as privadas foram irredutíveis. Sem alternativa os vereadores, deputados, secretários e então prefeito Kassub renunciaram aos respectivos mandatos. Instalou-se a anarquia no município.

O povo nomeou livremente representantes para negociar os direitos das privadas com a líder revolucionária. Com tanta verba disponível as privadas conquistaram piso salarial e registro em carteira; assessores permanentes para limpeza; férias remuneradas; décimo terceiro, quarto e quinto salários; adicional por insalubridade; garantia de fundos e aposentadoria integral após quatro anos de serviços. A partir daí passou-se a respeitar a vida pública da privada.

MORAL DA ESTÓRIA:
VIVER DE MERDA SÓ FÁBRICA DE ADUBO E PRIVADA!


Ps.: escrito originalmente para a Terceira Mostra Artística Temática da Turma Braba

Fábio Roberto

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