A medieval mídia acende as tochas junto ao leiloado legislativo, cujos
gritos fossilizados, saídos de suas cavernosas bocas, fundem-se ao inflamado coro de apoio ao judô judiciário. Uns poucos monopolizam a
improvisada arquibancada.
Imobilizado, o executivo, de terno e gravata em vez de quimono, não pede
água, pede whisky. O oponente se enfurece da ousadia e aplica um
desastrado wazari, derrubando os sigilos. A chusma entusiasmada ordena ao heroico
judoca o ippon, alguns pedem que o executivo se deixe cair por si mesmo.
A midieval e os leiloados querem ver sangue, mas não podem ver
sangue porque sangue é vermelho e vermelho é estritamente proibido
nesse azulado tatame.
Os apostadores com suas notas descabeladas nas mãos, os patrocinadores com suas notas bem penteadas no bolso, fazem pressão pelo resultado. Os primeiros salivam ameaças. Os outros dão diagnósticos terríveis, a depender do resultado. Os organizadores do evento se entreolham e se comunicam com certa cumplicidade submissa.
A faixa preta, que devia estar na altura dos
olhos, circunda a cintura do judoca, qual bambolê de algum Saturno
imaginável. Ele tenta derrubar o adversário puxando pela gravata,
os juízes discutem se isso é ou não um golpe válido. Outros, se é de
fato um golpe. Outros ainda, se o uso da gravata é permitido. Um
cogita se o engravatado em si é um competidor legítimo, questiona a autenticidade de sua classificação. Alguém propõe um exame de doping surpresa ali mesmo durante
a luta, qualquer coisa que afete o resultado da disputa. Discutem tanto que a bancada quase sai na pancada.
Todos se engalfinham, se atracam. A área de combate se alastra para o ginásio todo. De repente é várzea, se já não era.
Enfim, diante desse cenário cruamente realístico toda matéria onírica antes plástica e espontaneamente abstrata se reduz a tédio observável, petrificado. Toda metáfora se empalidece e desbota inutilizável. Toda hipérbole se esvazia e murcha comedida. Toda ficção, a mais absurda, se espanta e se queda boquiaberta. Toda substância química alucinógena desperta num colchão de sobriedade jamais experimentado. Garanto, nada, nada é mais exagerado, imprevisível e inacreditável do que a própria realidade.
Lê
Todos se engalfinham, se atracam. A área de combate se alastra para o ginásio todo. De repente é várzea, se já não era.
Enfim, diante desse cenário cruamente realístico toda matéria onírica antes plástica e espontaneamente abstrata se reduz a tédio observável, petrificado. Toda metáfora se empalidece e desbota inutilizável. Toda hipérbole se esvazia e murcha comedida. Toda ficção, a mais absurda, se espanta e se queda boquiaberta. Toda substância química alucinógena desperta num colchão de sobriedade jamais experimentado. Garanto, nada, nada é mais exagerado, imprevisível e inacreditável do que a própria realidade.
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The best
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